coisa estranhas #134
clima e castigo: solidariedade performática
doe somente pra quem a gente pode confiar
quando os diques se romperam: réquiem em quatro atos
consequências da supressão da vegetação nativa campestre do Pampa
Pirate Care modalidade de ativismo na interseção entre cuidado e pirataria
A desobediência civil é uma obrigação moral em tempos de crise climática?
O papel da biblioteca em face do apocalipse
quando as águas baixarem prometam doar bons livros
leituras essenciais de cli-fi antes que se tornem não-ficção
destruição de bibliotecas faz parte da nossa mitologia profissional, mas reconstrução é um fator ainda mais relevante. Meio sem querer esbarrei no conceito de Standard Template Construct, que seria uma base de registros do conhecimento que contém os esquemas de tudo que uma colônia precisará para sobreviver no futuro, desde ferramentas simples como pás, até máquinas complexas como sistemas de purificação de água em grandes volumes.
STC aparece no universo do jogo Warhammer 40.000. Eles são ao mesmo tempo um construct e um constructor, programas analíticos e de processamento complexos, inteligências artificiais, contendo todo o conhecimento tecnológico humano até determinado ponto no futuro. Eles são capazes de oferecer designs que se adaptam à realidade dos novos colonos (por exemplo, preciso de instruções para drenagem de grandes pântanos e diques de contenção na área “re-colonizada” de Porto Alegre).
Não estamos com muita paciência para divagações Cli-Fi, mas o que me pega é que na fantasia do joguinho, os STC são ironicamente responsáveis pela implosão da ciência no final da “Idade das Trevas da Tecnologia”: o antigo conhecimento tecnológico sobrevive apenas porque foi preservado em cópias impressas do STC.
Voltemos ao mundo real, STC dá nome a uma parte do projeto Nexus, uma versão atualizada dos sistemas de distribuição de artigos científicos, como o Sci-Hub. Para mitigar a dependência do sistema proprietário (no caso, eles usam bots no Telegram), construíram a sua versão do Standard Template Construct com base em tecnologias distribuídas existentes para garantir o fluxo de conhecimento contínuo. Não adianta uma jurisdição querer bloquear o compartilhamento de arquivos, porque a rede é descentralizada e pode ser replicada facilmente.
Por conta do meu trabalho como bibliotecário, venho acompanhando o Nexus e Pirate Care, como práticas que representam uma forma de ativismo trans-digital e desobediência civil. O que essas iniciativas propõem é um repensar sobre um outro sujeito em relação às noções de compartilhamento de conhecimento e cuidado coletivo (que a meu ver tem bastante relação com os refugiados climáticos), em vez daquele forjado por sistemas de relações estritamente capitalistas (os mesmo que ditam o ritmo do fim do mundo: os bilionários, os latifundiários, os austericidas, os negacionistas).
Enfim, gostaria de deixar um abraço aos amigos bibliotecários do RS, são muitos e gente da melhor qualidade. Trabalhar para que nossas realidades sejam diferentes daqui pra frente.